Hilab | 07 jul 2020
A hormonioterapia é um tratamento seguido por muitas pessoas transgênero para modificar o seu corpo através do uso de hormônios, sejam eles masculinos ou femininos. No Brasil, as terapias hormonais são proibidas para menores de 16 anos, e as cirurgias só são liberadas a partir dos 18.
Leia o texto a seguir e entenda como acontece a transição hormonal, seus estágios e quais passos estão envolvidos.
O objetivo da terapia hormonal é fazer a pessoa transgênero ficar mais à vontade consigo mesmo, de maneira física e psicológica. Isso também vai depender da visão do paciente e seus desejos, assim como os pacientes que não buscam a cirurgia de redesignação sexual, por exemplo.
No entanto, as pessoas trans precisam ser realistas sobre as mudanças esperadas, visto que os hormônios não podem alterar totalmente sua forma ou sua altura.
Existem diversos hormônios produzidos no organismo por um sistema de glândulas, que são liberados diretamente na corrente sanguínea e são transportados por todo o corpo. Esse sistema é chamado de sistema endócrino, e o médico responsável por essa área da medicina é o endocrinologista.
Entre eles estão os hormônios sexuais: o hormônio masculino testosterona, produzido pelos testículos, e o hormônio feminino estrogênio, produzido pelos ovários.
Qualquer organismo produz naturalmente testosterona e estrogênio: pessoas com sexo masculino possuem uma pequena quantidade de hormônio feminino, por meio da testosterona que é convertida em estrogênio. E independentemente do sexo biológico, as glândulas suprarrenais, que se encontram sobre os rins, produzem pequenas quantidades de testosterona.
Com o bebê ainda na barriga da mãe, os hormônios sexuais em conjunto com fatores genéticos designam o desenvolvimento do sistema reprodutor, o cérebro e as características físicas, como a altura, pêlos, como a gordura é distribuída pelo corpo e a massa muscular.
Ao longo da vida, os hormônios sexuais continuam interferindo nas características e desenvolvimento no organismo, chegando ao ápice na puberdade e diminuindo naturalmente na terceira idade.
No início do tratamento, é comum os médicos receitarem medicamentos que bloqueiam os hormônios sexuais, para interromper a produção hormonal de seu próprio corpo. Dessa forma os hormônios prescritos agem com mais eficácia.
No caso de mulheres trans, o estrogênio tem efeitos que acentuam uma aparência feminina, como: a gordura começa a ser mais distribuída pelos quadris e o tamanho do órgão reprodutor pode ficar ligeiramente reduzido, a massa muscular e a energia que podem ser reduzidas.
Os pelos também ficam mais fracos, e com isso muitas mulheres trans associam a hormonioterapia para adiantar tratamentos à laser e outras técnicas de depilação definitiva. Apesar desse efeito benéfico causado pelo estrogênio, a calvície masculina não é necessariamente revertida.
Nos homens trans, a testosterona traz o crescimento da barba e de pêlos mais grossos pelo corpo, deixa a voz mais grossa, aumenta a libido, promove o ganho de massa muscular e pode causar o aumento do clitóris.
Alguns homens trans também desenvolvem acne e desencadeiam calvície masculina. A menstruação é interrompida, embora possa acontecer algum sangramento e nesse caso é preciso o ajuste da dose, com o auxílio médico.
A maioria das modificações se desenvolvem de forma lenta. Alguns efeitos começam após alguns meses de terapia hormonal e podem ser irreversíveis, como o grave da voz em homens trans e o crescimento de seios em mulheres trans.
Sim, para manter os efeitos causados pelos hormônios sexuais, é preciso levar o tratamento pelo resto da vida. Porém, se em algum momento a mulher trans realizar a remoção de seus testículos ou o homem trans de seus ovários, a dose de hormônios geralmente é reduzida após se fazer a cirurgia.
Ainda há poucas pesquisas sobre o uso de hormônios e o risco à saúde, porém com o acompanhamento médico o tratamento hormonal é seguro, já que os medicamentos prescritos são muito parecidos com os hormônios naturais produzidos pelo organismo.
A Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia considera os maiores riscos aos pacientes trans a osteoporose, o câncer de mama em mulheres trans que tomam estrogênio, doenças cardiovasculares, e câncer de próstata em mulheres trans, mesmo naquelas que realizaram a redesignação de sexo.
Os riscos mais graves ao tomar estrogênio são a trombose, derrame, embolia pulmonar e o funcionamento alterado do fígado. Já o maior risco causado pela testosterona é a policitemia (superprodução de glóbulos vermelhos) que induz a coagulação do sangue e gera cansaço, fraqueza e falta de ar.
Para diminuir os riscos, é importante manter um estilo de vida saudável, com uma alimentação balanceada e exercícios, evitando o uso de álcool e outras substâncias que possam prejudicar o tratamento. O tabagismo, além de trazer riscos aos pulmões, reduz os efeitos do estrogênio no tratamento de mulheres trans.
Independente do gênero, a transição hormonal causa infertilidade após um certo tempo. Porém, tomar hormônios não é considerado um método contraceptivo, já que é incerto quanto tempo leva para o tratamento tornar a pessoa infértil.
Para se ter filhos, a pessoa trans deve interromper a hormonioterapia. Esse foi o caso do casal trans Danna Sultana e Esteban Landrau, onde ambos decidiram parar com o tratamento hormonal para que pudessem engravidar.
Se uma mulher trans não possuir testículos removidos, ela será totalmente infértil. E também, um homem trans que tiver seus ovários removidos não pode engravidar naturalmente.
Para as mulheres trans o tratamento é feito com injeções à base de estradiol. Para pessoas acima de 40 anos, fumantes ou com problemas circulatórios é recomendado o uso de pílulas, géis e/ou adesivos de estradiol.
O uso de progesterona aumenta o risco de trombose e também pode inibir a ação do estrogênio. Essa inibição pode causar o efeito reverso, provocando o aumento da libido e o crescimento de pelos faciais, mesmo com a redução da testosterona.
Para homens trans, geralmente é utilizada a testosterona via injeção intramuscular ou subcutânea a cada duas ou três semanas. Outros métodos também são disponibilizados como comprimidos e adesivos ou géis de testosterona que devem ser aplicados na pele diariamente .
Para pessoas com alergia ao amendoim, é recomendada a injeção de enantato de testosterona, ao invés de outros tratamentos de testosterona.
O tratamento de transição de ambos os gêneros, também pode incluir o uso de goserelina ou leuprorrelina, bloqueadores de hormônios que tem menos efeitos colaterais. Porém, nem sempre é necessário o seu uso porque a testosterona sozinha é eficaz para muitos homens trans.
O impacto da transição hormonal também acontece no estado emocional. Assim como a puberdade é uma montanha-russa de emoções, a hormonioterapia pode mexer igualmente com os sentimentos durante a transição.
Pessoas trans que passam pela hormonioterapia podem apresentar uma série de ideias com emoções, sentimentos e pensamentos mais intensificados. Esses sentimentos podem afetar o comportamento e o relacionamentos com as pessoas.
Mesmo não apresentando esses sintomas, a psicoterapia para pessoas em transição hormonal é recomendada pelos especialistas. É preciso que o paciente busque ou seja encaminhado para um profissional com experiência em atender pessoas transgênero. Assim, o paciente passar a entender seu corpo e a si mesmas enquanto passam pelo tratamento.
Alterações na sensibilidade sexual também são comuns com o tratamento hormonal, podendo aumentar ou diminuir a libido. Dependendo do paciente, as alterações causadas pela hormonioterapia são compensadas pelos ganhos na imagem corporal desejada, conforme sua a identidade de gênero.
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Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. Posicionamento Conjunto. Disponível em: <https://www.endocrino.org.br/media/pdfs_documentos/posicionamento_trangenero_sbem_sbpcml_cbr.pdf> Acesso em: 19/06/2020.
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo. A Complexidade da Terapia Hormonal. Disponível em: <http://www.cremesp.org.br/pdfs/eventos/eve_03102016_165923_Elisa%20Ugarte%20Verduguez%20-%20Psicoterapia%20preparatoria%20para%20cirurgia%20de%20transgenitalizacao.pdf> Acesso em: 18/06/2020.
Scottish Trans. A guide to hormone therapy for trans people. Disponível em: < https://www.scottishtrans.org/wp-content/uploads/2013/06/NHS-A-Guide-to-Hormone-Therapy-for-Trans-People.pdf> Acesso em: 17/06/2020.
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Excelente artigo. Bem esclarecedor.
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